sexta-feira, 12 de janeiro de 2007

Dois sonetos de Dante Alighieri (II)

Da leitura deste poemas, podemos verificar que, a despeito das inovações formais e conceptuais introduzidas pelo Dolce stil nuovo, a descrição da dama não é muito diferente daquela que poderíamos encontrar na poesia galego-portuguesa do séc. XII, visto que esta descrição tem uma quase notável ausência de caracterização fisiossomática.

De qualquer modo e segundo J. V. Pina Martins (ibidem, p. 130):
Dante é porventura, de todos os poetas do Dolce stil nuovo, o mais avesso a complacências sensoriais. (...) Sabemos, por uma tradição digna de crédito, que o Dante vivo era muito sensível à fascinação dos encantos femininos, e mesmo à alegira das experiências fisicamente eróticas, como nos informa Boccaccio, mas na Vita Nuova não era possível serem fixados resíduos de uma tal humanidade, pois Dante movia-se num mundo lírico que não conseguiu revolucionar, como faria depois Petrarca.
De qualquer modo, a poesia do Dolce stil nuovo é uma revolta contra as restrições, convencionalismos e formalismos da poesia provençal. No aspecto formal, a canção, o soneto e a balada substituíram as formas gastas. Há um maior individualismo, uma maior sinceridade na expressão dos sentimentos, que abriu caminho para a revolução protoganizada por Petrarca e os seus Rerum uulgarium fragmenta ou Canzoniere ou Rime Sparse, frequentemente mais conhecidos por Rime.

XXVI

Tanto gentile e tanto onesta pare
La donna mia, quando'ella altrui saluta,
Che'ogne lingua deven tremando muta,
E li occhi no l'ardiscono di guardare.
Ella si va, sentendosi laudare,
Benignamente d'umiltà vestuta;
E par che sia una cosa venuta
Da cielo in terra a miracol mostrare.

Mostrasi si paciente a chi la mira,
Che dà per li occhi una dolcezza al core,
Che 'ntender no la può chi no la prova:
E par che de la sua labbia si mova
Un spirito soave pien d'amore,
Che va dicendo a l'anima: «Sospira».


XXVI

Aparece gentil e tão honesta

Minha senhora quando nos saúda,
Que cada voz, tremendo, fica muda
E os olhos não ousam mesmo olhar.
Vestida de humildade, lá vai ela,
Benignamente ouvindo-se louvar;
E dir-se-ia coisa de espantar
Vindo do céu à terra, num milagre.

Tão agradável surge a quem a vê
Que pelos olhos dá ao coração
Dulçor para entender, de conhecer.
Dos seus lábios parece que desliza
Um sopro de amorosa suavidade
Que vai dizendo à alma, tu, suspira!

2 comentários:

Henrique Gomes disse...

Dante é divino. Já li A Divina Comédia duas vezes e alguns de poemas de Vita nuova... São fantásticos, perfeitos. São esses que são os grandiosos... Um Dante, um Camões, Cervantes, Shakespeare, Virgílio, Horácio... *-*

Thais Kercia disse...

Dante como sempre me fazendo apaixonar .